1 - Para parar o ciclo de violência

 as palavras, quando saem dos meus dedos,

ai

é como se mordessem.

É como se as palavras, silenciosamente, tivessem afiado suas bordas e cada vez que termino de tocar em uma

ai

meu desavisado sangue as alimenta.

Mas preciso delas agora, preciso tirá-las do seu dormir. Para tentar parar o ciclo.


Estou muito machucado. Numa ponta da existência em que coleciono cicatrizes invisíveis. Em caminhos que infeccionam meus pés. Delicadamente destruído.

Me foi demandado silêncio. Silêncio e serviço. Só posso gritar no encontro dos meus dedos com essas teclas espinho. E não quero retornar a agressão mais. 


Preciso jogar a dor, a frustração, o caos que cai em dos outros corpos em outros lugares. Preciso descartar. Sei que guardar não posso, que é aniquilação por demais já só sendo assim.


Faço esse esforço textual pra, talvez, reaprender a escrever e gritar o grito que gritam em mim nas palavras.


Pedir "perdão", abaixar a voz, fazer o que deve ser feito, e gritar aqui.

Não é à toa que as palavras me espetam os poros.

Que quem vai sofrer a partir de agora são elas.

E que dura sobrecarga é ser aquilo que segura toda a energia destrutiva e tenta, em seu silêncio, parar o ciclo de violência.


Hoje, dentre as muitas violências, o que me sobrecarregou foram as seguinte coisas:

1 - um filho não cuida de uma mãe, uma mãe cuida de todos os filhos (frase proferida enquanto eu colocava um fralda, após arrumar a tempo tudo o que precisava ser arrumado, deixando todas minhas demandas em segundo lugar);

2 - estava gritando seu nome, estou sem celular e você não me ouviu, por que você não respondeu? (ao que respondi que usava fone de ouvidos e pedi perdão, que usaria só um lado e cuja tréplica foi, ainda, mais ataque, violência esganiçada, ignorando o perdão por estar de fone de ouvido).


O que dorme ao lado voltou a dormir.


A raiva veio, como vem em muitos momentos, e quase parasitou minha língua. Quase agarrou meu peito e escalou pelo esôfago, quase explodiu meus dentes num desejo terrível de resposta. Mas calei.

A raiva queria vir nos dedos também, nas ações. 

Mas calei.


A raiva está se diluindo nas palavras agora (perdão, palavras, pela carga. perdão e obrigado. vocês sempre estiveram aqui. só vocês, em todos os momentos).


Agora devo checar se o animal congelado descongelou. E na beirada da noite, sanar desejos de fomes que talvez não sejam assim que devem ser sanados.

o processo longo da janta me acorda do transe e da cura da escrita.


meus pés doem tanto, tanto. meus pés, meus braços, meus ombros.

Tá tudo certo, ninguém se preocupa.

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